A Carne de Jesus é Alimento?

Data: quarta-feira, 7 de abril de 2004

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No Evangelho de João, cap.6 v.53, nós encontramos palavras de Jesus que escandalizaram os seus próprios discípulos:

"Em verdade em verdade vos digo: Se não comerdes a carne do Filho do homem, e não beberdes o seu sangue, não tendes vida em vós mesmos". João, 6, v 53.

"Muitos dos seus discípulos, tendo ouvido tais palavras, disseram: Duro é este discurso. Quem o pode ouvir?" João, 6 v 60.

"Em vista disto, muitos dos seus discípulos o abandonaram, e já não andavam com Ele". João, 6, v 66.

Infelizmente, seus próprios seguidores não compreenderam o aspecto esotérico das suas estranhas palavras.

Não podemos, entretanto, condená-los: O choque do primeiro momento deve ter sido devastador.

Comer a carne de Jesus?

Epa! Será que eu ouvi direito?

Uma frase do Mestre, entretanto, esclarece tudo:

"O espírito é o que vivifica; a carne para nada aproveita; as palavras que eu vos tenho dito são espírito e vida." João, 6, v 63.

Aqui nós percebemos, com clareza, que as palavras de Jesus eram simbólicas.

Ele utilizara a sutileza do espírito para que ninguém misturasse o seu "corpo" material no contexto.

"A carne para nada aproveita..." - disse Jesus.

Não esqueçamos que a "letra mata".

Analisemos o que acontece, quando ingerimos alguma coisa.

O nosso organismo retira do alimento as calorias, ou energias vitais, com todos os seus componentes.

Estas energias são absorvidas pelo nosso corpo, e passam a fazer parte integrante dele.

Calorias, vitaminas, sais minerais, etc., que pertenciam ao alimento, agora estão dentro de nosso corpo.

Para que isto aconteça, todavia, é preciso que o elemento material do alimento seja "morto", para que as energias sejam liberadas.

Ninguém sobrevive sem alimentação.

Uma parte de todas aquelas misturas que engolimos é absorvida pelo corpo.

Elas se transformam numa espécie de combustível que nos mantém dinâmicos, vivos, e em movimento.

Nós aproveitamos talvez um cálice de toda esta massa alimentar que ingerimos.

Vimos, então, que o alimento "morreu" - em sua antiga forma - depois de nos presentear com sua seiva.

Aqui nós chegamos ao ponto.

Todo este processo de nutrição foi aproveitado por Jesus, para nos ensinar a importância da comunhão com Ele.

Com o mesmo "apetite" com que devoramos o prato de comida, teremos que alimentar também o nosso espírito.

A busca do alimento divino deve ser uma prática constante.

O Espírito do Cristo precisa se transformar no alimento que saciará a nossa fome espiritual.

Enquanto humano, Jesus não poderia vivenciar esta faculdade de estar em toda a parte, ao mesmo tempo.

Após a ressurreição, porém, como Espírito Universal, Ele alcançou mais este dom.

"Onde duas ou três pessoas estiverem reunidas, em meu nome, ali estarei no meio delas."

Outra certeza da presença de Jesus:

"Eu estarei convosco, todos os dias, até a consumação dos séculos."

Depois da morte, glorificado pela ressurreição, Ele se transformou no Espírito universal, que sustenta nossa vida.

O Apóstolo Paulo afirma:

"Morro todos os dias, e é por isso mesmo que vivo. Mas já não sou eu que vivo... É o Cristo que vive em mim .."

Para recapitular, vamos repetir as palavras chaves do texto:

"Se não comerdes a carne do Filho do homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis vida em vós(...)".

Procuremos agora resumir as nossas conclusões:

Nada existe, no mundo material, que nos penetre tão profundamente quanto a comida e a bebida que ingerimos.

Todo o nosso equilíbrio depende de tais elementos.

Temos que reconhecer:

É fantástica a simplicidade com que o Mestre formulou esta doutrina da fusão do humano e do divino:

Deus em nós...e nós em Deus.

Estamos diante de uma autêntica simbiose.

O pão da terra nutrindo nosso corpo; o pão do céu alimentando nosso espírito.

Os terroristas e os torturadores conhecem o poder da desnutrição; eles deixam a pessoa sem comer, para enfraquecê-las.

É tão grande a integração da comida ao corpo, que a essência da comida fica fazendo parte do nosso próprio corpo.

Sabiamente o Mestre usou a realidade prosaica, para definir o que esperava de nós.

Fique claro: O importante é o lado esotérico, o lado místico da busca... a "fome" pela nossa integração com Deus.

Cerimônias exteriores são inócuas; elas não produzem esta integração.

Com o mesmo apetite com que almoçamos, teremos que nos alimentar do Espírito de Deus que nos envolve e está dentro de nós.

No dizer do Apóstolo Paulo: "Já não sou eu que vivo - é o Cristo que vive em mim".

Eu sei que não é uma tarefa fácil.

Para alcançar este estágio, teremos que desintegrar o nosso "ego",

Sem a morte do nosso personalismo, o "grão de trigo" não germinará... não produzirá frutos.

A solução é uma só: Desintegrar-se no espírito crístico é a única maneira de sermos felizes.

Só quando eu morrer para minha cobiça, para meu orgulho e para minha luxúria, é que estarei ressuscitando para o altruísmo, para a benevolência, e para o amor universal.

Não existem caminhos intermediários.

Segundo palavras de Huberto Rohden, o "homem só sabe, realmente, aquilo que viveu, que experimentou vitalmente, que sofreu dentro dele mesmo."

"Ele sabe aquilo que a tal ponto se fundiu com o seu "EU", que com ele forma um só bloco, uma só entidade, uma só natureza."

E Huberto Rohden vai mais além:

"A palavra 'saber' não significa tão somente noção intelectual, mas, também, tomar o sabor de alguma coisa. "

Os mestres de cozinha dizem: isto sabe muito bem!

E batem na barriga, satisfeitos.

Eles querem dizer: esta comida tem um sabor gostoso: desce redondinha.

Portanto, meus amigos, fica bem clara uma coisa:

O dia em que nós formos impelidos ao encontro das verdades eternas, com o mesmo ímpeto que procuramos o jantar, com certeza estaremos no caminho certo.

Saborear é sinônimo de saber.

Abram o dicionário Aurélio, e vocês encontrarão lá:

Saber bem = agradar ao paladar.

Saber mal = desagradar ao paladar.

Tudo é uma questão de volúpia, de entusiasmo, de entrega total.

Jesus deseja discípulos idealistas.

Jesus deseja discípulos com apetite voraz.

Apetite voraz pelas reformas interiores...

Apetite voraz pela difusão das verdades...

Apetite voraz pelo socorro aos irmãos desvalidos...

O próprio Mestre mostrava este apetite, quando disse: "Meu banquete é fazer a vontade de meu Pai que está nos Céus!."

Mal comparando, meus amigos, é aquele caso da laranja, que os sábios estudaram, durante anos, sem jamais experimentá-la.

Escreveram livros e livros sobre a laranja, dissecando-a, em todos os seus aspectos.

Então perceberam uma criança chupando uma laranja.

Um deles resolveu experimentar.

Os outros se aproximaram, desconfiados, e acabaram também saboreando a laranja.

Dali a pouco, por unanimidade, os sábios concluíram:

- Chupando a laranja, aprendemos mais sobre ela, do que em todos estes anos de pesquisa.

É isto aí, meus amigos!

Cristo não é para ser contemplado de longe como se estivéssemos vendo a lua, pálida e distante.

Cristo tem que ser vivenciado.

A doutrina cristã tem que ser saboreada.

Cristo é o "Pão da Vida", como Ele mesmo disse.

Nós temos que comer este Pão, para que Ele se espalhe pelas mais escondidas fibras de nosso corpo espiritual.

Cristo é o vinho!

Nós temos que beber deste vinho, com volúpia, para que Ele nos anime e nos entusiasme.

Outra vez, vamos citar palavras de Huberto Rohden, escritas no livro "Filosofia Cósmica do Evangelho":

"Se a eucaristia fosse compreendida e vivida... seria ela uma verdadeira comunhão, uma união diária e permanente com Deus.

O que estamos vendo, porém, é que ela se tornou apenas um rito sacramental para uns...e uma fonte de renda para outros."

E o pior da coisa é aquilo que Rohden não disse.

O pior é a desunião causada por interpretações tendenciosas.

As dissensões suscitadas pelos intérpretes do texto só encontram paralelo na famosa montagem do "...tu és Pedro..."

Estes dois temas dividem as igrejas há vinte séculos.

Em dois mil anos de cristianismo, todas as batalhas nasceram neste mesmo campo.

Certa vez, eu perguntei a um sacerdote por quê eles não admitiam o "Pão e o Vinho" como simbolismo?

Ele respondeu que a teologia definira tudo há muitos séculos, e que restava aos cristãos obedecer... e ponto final.

Aquele que pensar diferente torna-se hereje.

Infelizmente, o mundo está mapeado, e cada zona pertence a um grande sacerdote.

Ninguém quer ceder!

Martinho Lutero se rebelou contra os padres, pregando o livre exame da Bíblia.

No entanto, se eu chegar em uma igreja protestante, disposto a debater Bíblia, serei expulso.

As posições estão petrificadas...

As trincheiras estão bem definidas!

Ninguém arreda pé!

A.J.Cronin, famoso escritor inglês, escreveu:

- "Ser religioso é uma questão de latitude ou longitude."

O mundo está mapeado, e cada zona pertence a um grande chefe, infalível e todo poderoso.

Graças a Deus, nós, espiritualistas, somos uma pedra no calçado de todos eles, por que a nossa doutrina é libertária.

O nosso Cristo pode ser acionado, em qualquer tempo, em qualquer lugar...e por qualquer pessoa de boa fé!

Foi Ele mesmo quem disse:

"Eu estarei convosco, todos os dias, até a consumação dos séculos."


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