A Besta que apareceu da terra

Data: domingo, 15 de agosto de 2004

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Já abordamos, anteriormente, aquela primeira "Besta" que se levantou do mar (Apocalipse, 13 v 1).
Hoje, estudaremos a segunda "Besta".
"E vi outra Besta, que subia da terra, a qual tinha dois chifres, semelhantes ao Cordeiro, mas falava como o Dragão".
Apocalipse 13,11.
Para princípio de conversa, explicaremos a razão da primeira Besta ter surgido do mar...
... e a segunda ter se levantado da terra.
Em Daniel, 7 v 2, foi profetizado o nascimento de quatro impérios, simbolizados por feras saídas do mar.
O mar com suas ondas revoltas sempre revelou estruturas precárias: a política dos homens.
Ao contrário do mar, a terra simboliza coisas concretas.
A terra é o chão onde se firmam os alicerces.
Por isso, o profeta do Apocalipse teve o cuidado de separar as duas "Bestas":
Uma delas teria suas raízes nas águas revoltas da política.
A outra brotaria de algo eterno: a religiosidade humana.
Por isto, a segunda "Besta" aparecera com chifres "semelhantes ao Cordeiro", mas "falava como Dragão".
Lembramos que Jesus foi chamado "Cordeiro de Deus".
Como pode uma "Besta" ter ligação com o Cristo?
Metade Cordeiro e metade Dragão?
Pois saibam que o texto é muito claro:
A palavra "chifre", em Roma, significava poder.
O "chifre do Cordeiro" é distintivo do poder do Cristo.
As últimas palavras do versículo 11, todavia, nos deixam perplexos.
Apesar da aparência de "Cordeiro", aquelas figuras travestidas de "santos" emitem a "voz do Dragão".
Por isso a palavra "Besta" para definí-las.
Com vozes ásperas, elas decretam sentenças de morte.
"São lobos em pele de Cordeiro", como diz o povo.
Aqui, nós somos obrigados a nadar contra a maré de poderosa corrente teológica:
Em nossa opinião, o imperador Constantino trouxe mais males para o cristianismo do que todas as perseguições reunidas.
Foi no seu governo que os dirigentes cristãos abandonaram o idealismo sofrido das catacumbas para se instalar em palácios.
A vida fácil destruíu-lhes a religiosidade.
Seduzidos pela política, eles jamais foram os mesmos.
Quem fora perseguido tornou-se perseguidor.
Apresentavam-se disfarçados de discípulos de Jesus.
Exibiam os "dois chifres" da mística, mas seus atos não se compatibilizavam com a doutrina do Evangelho.
Esqueceram o "amai-vos uns aos outros".
A violência tornara-se o estandarte que norteava suas ações.
Repetindo sentenças de morte, estavam mais para Dragão do que para Cristo.
No ano 385, o imperador Maximus, com aprovação do clero, executou o "herege" Prisciliano.
A união do clero com o poder romano ocorrera em 380.
As duas partes fundiram seus interesses.
As legiões de Roma passaram a defender estes "cristãos", metade Cristo - metade Dragão.
Simplesmente a força do espírito fora substituída pelo espírito da força.
A "Segunda Besta" se acomodou nos braços da "Primeira Besta".
E aqui encontramos a explicação:
A Inquisição foi esta figura da "Besta" que ostentava o distintivo do poder do Cordeiro, mas que falava "grosso" como Dragão.
Pela oportunidade, vale repetirmos alguns comentários sobre a palavra "Inquisição".
Utilizaremos a Enciclopédia Barsa, porque se trata de uma fonte insuspeita:
"Se bem que a Inquisição só se apresentasse em plena pujança no século XIII, suas origens remontam ao século IV.
A partir de então, data a perseguição àqueles que não aceitavam o credo católico.
Tinham os seus bens confiscados, e alguns chegaram a ser condenados à morte, como aconteceu com certos grupos de maniqueus e donatistas.
A partir da metade do século X (...) registraram-se numerosos casos de execução de hereges, na fogueira ou por estrangulamento.
(...) o Papa Inocêncio III, responsável por uma cruzada contra os albigenses (...) praticou execuções em massa.
O processo era sumário.
O acusado podia ignorar o nome do acusador.
Mulheres, crianças e escravos podiam ser testemunhas de acusação, mas não de defesa.
Num destes processos consta o nome de uma criança de apenas dez anos.
O Padre dominicano Bernardo Guy - em seu livro Liber Sententiarum Inquisitionis - relata que para a obtenção de confissões usava-se o enfraquecimento das forças do prisioneiro"
.
Trazendo a público este trecho da Enciclopédia Barsa, eu pergunto para vocês:
Estarei exagerando ao identificar a "segunda Besta" como parte integrante da própria religião cristã?
Elimine seus preconceitos, e deixe sua consciência responder.
O Papa João Paulo II procedeu assim: Ele teve a coragem de pedir perdão pelos crimes de seus antecessores.
Ele veio a público, para explicar que a Inquisição sempre foi uma pedra no seu chinelo.
Usou a tribuna pública para que não restassem dúvidas...
...E todos ficaram sabendo, pela voz do próprio Papa, que as "portas do inferno prevaleceram".
Aliás, o prevalecimento "das portas do inferno" também ocorreu em nossos dias.
Na revista Veja de 25 de março de 1998 foi publicada reportagem sobre a omissão do Papa Pio XII, no Holocausto Nazista.
Diante daquela tragédia, Pio XII mantivera-se ausente.
Naquela reportagem, ficamos sabendo que João Paulo II acenava com pedido de desculpas dirigido aos judeus.
Também a revista Veja citou que o Papa "reabilitou" Galileu Galilei, que "foi obrigado pela Inquisição a renegar a teoria de que a terra orbita em torno do sol".
Em 1633, o astrônomo foi coagido a concordar com aberração científica para não ser queimado pelos inquisidores.
Isto também pesava na consciência de João Paulo II.
"Reabilitando" o astrônomo, ele tenta, de alguma forma, aliviar o carma coletivo dos seus antecessores.
Acompanhando o reconhecimento de um Papa, a nossa tese ganha força.
Repetimos Apocalipse:
"E vi outra Besta que subia da terra, e que tinha dois chifres semelhantes ao Cordeiro, e que falava como o Dragão".
Apocalipse, 13 v 11.
Esta "Besta", conquanto seus esforços em se parecer com Jesus, é traída pela sua voz agressiva...e violenta.

Conta-se que um fazendeiro empobreceu tanto, que não tinha mais dinheiro sequer para alimentar o seu burro...
Atravessava um período de vacas magras, e o seu animal definhava por falta de comida.
Um dia, o fazendeiro encontrou, no campo, um tigre morto.
Na hora, surgiu-lhe uma idéia luminosa.
Vestiu o burro com a pele do tigre.
Foi a conta!
O falso tigre assustava todo mundo.
Ninguém ousava barrar-lhe o caminho.
Onde chegava, toda comida era sua.
O burro engordou, e ficou forte.
Um dia, porém, o caldo entornou.
Atraído pelo zurrar de algumas mulas, o burro não conseguiu disfarçar o instinto...
... e zurrou, também!
A farsa foi descoberta.
E o burro foi morto a pauladas.

Por esta lenda, nós chegamos a uma conclusão:
É muito difícil esconder a "fala".
Pelo nosso falar seremos reconhecidos.
Não é possível usar os chifres do Cordeiro, se a nossa voz é igual à voz do Dragão.
É claro que o burro não poderia enganar como tigre, quando zurrar é o som natural de sua "voz".
Pela nossa "fala" seremos flagrados.
Por esta razão, eu adquiro o direito de afirmar: Constantino foi um desastre para o cristianismo.
Ele "falava"de forma diferente.
Ele veio contaminar a inocência primordial dos primeiros seguidores de Jesus.
Constantino destruíu o elo mais revelador do apostolado:
"Amai-vos uns aos outros: Nisto conhecerão todos que sois verdadeiramente meus discípulos".
Palavras de Jesus em João 13 vv 34 e 35.
Emitindo com clareza a minha opinião, eu não posso faltar com a verdade: Constantino criou religião com outro rosto.
O dilema se estabelece: Jesus ou Constantino?
Teremos que escolher entre os dois.
Os templos dos deuses romanos foram destruídos, mas o espírito do paganismo permaneceu...
...E novos templos se ergueram para consolidar a vitória.
Os preceitos trazidos por Jesus foram desfigurados pela prepotência das legiões romanas.
Não resta qualquer dúvida: a Inquisição é a "segunda Besta"...
...E o iniciador do desastre foi Constantino.
Estado e Igreja se sustentando, numa única estrutura.
No ano 380, aquelas criaturas saíram das catacumbas para integrar a elite do Estado Romano.
Nas palavras do Apocalipse: a segunda Besta fez "(...)com que a terra e os seus habitantes adorassem a primeira Besta".
Apocalipse, 13 v 12.
Roma (primeira Besta), já agora governada por Teodósio I, recuperara-se da "ferida mortal" de algumas derrotas..
Uma religião nova servia para levantar o moral.
Por isso, a aliança fora estimulada.
A força de operar "milagres" ainda se encontrava viva, nos carismas que Jesus ensinara.
Abusou-se deste poder para reerguer o prestígio combalido dos imperadores.
- Uma mão lava a outra! - certamente exclamaram os césares, esboçando um sorriso malicioso.
É claro que os imperadores comemoraram a valiosa ajuda.
Leitura atenta do texto profético não deixa dúvidas:
"E ela" ( a segunda Besta) "exercitava todo o poder da primeira Besta (...) e fez que os habitantes da terra a adorassem.
E obrou grandes prodígios, de sorte que até fazia descer fogo do céu (...) à vista dos homens.
E seduziu (...) com os prodígios que lhe permitiram fazer diante da Besta, (...) que tinha recebido um golpe de espada, mas ainda estava viva"
.
Apocalipse, 13 vv 12 a 14.
Aproveitando aquele carisma da "Segunda Besta", o Império Romano sobreviveu, retardando o inexorável declínio.
A estória da cruz de fogo e as palavras escritas no céu reergueram o animo de um exército desmotivado.
As palavras de "marketing" - "com este sinal vencerás" - reacenderam a chama de uma nação decadente.
A "segunda Besta" (Inquisição) adubou a lavoura ressecada da "primeira Besta".
As duas se fortaleceram na violência e no crime:
"E foi lhe concedido que comunicasse espírito à imagem da Besta, e que falasse a tal imagem (...) e que fossem mortos todos os que não a adorassem sua imagem..."
Apocalipse, 13, v 15.
Profeticamente, este versículo define o nascimento da Inquisição.
No versículo seguinte, os dois poderes unidos decretam a extinção definitiva dos opositores.
"E todos os homens, pequenos e grandes, e ricos, e pobres, e livres, e escravos, passarão a ter um sinal na sua mão direita ou nas suas testas.
E que nenhum possa comprar ou vender, se não tiver o sinal ou o nome da Besta"
.
Apocalipse 13 vv 16 e 17.
Quem poderá viver sem "comprar ou vender"?
Pois saibam que este foi um dos decretos da Inquisição.
Os "herejes" ficaram proibidos de adquirir até mesmo provisões para o sustento da família.
Uma coisa nos surpreende nesta história da perseguição:
Apesar da repressão violenta, estes "benditos herejes" foram tantos que nos deixam assombrados.
Realmente, era preciso muita coragem para enfrentar tanta opressão.
Somente em Portugal, mais de trinta mil pessoas foram processadas pelos cardeais do Santo Ofício.
Na Espanha, quando o preposto de Napoleão chegou, para assumir o governo, a Inquisição ainda se encontrava lá.
Mais de mil anos este cancer destruíu as entranhas da sociedade.
E aqui nós chegamos a uma conclusão patética:
Os teólogos encarregados de interpretar as profecias nada encontraram no texto do Apocalipse.
Para eles, a Inquisição não existiu.
Passaram a borracha em mais mil anos de história.
Taparam o sol com a peneira do esquecimento.
Infelizmente para os teólogos, porém, aconteceu um acidente de percurso.
João Paulo II não somente apontou a Inquisição, mas pediu perdão ao mundo pelos seus crimes.
De agora em diante, eu espero que os teólogos modifiquem a interpretação do Apocalipse.
Afinal, sendo o Apocalipse um livro profético, a história é conseqüencia das suas previsões.
De nossa parte, o texto em estudo é claríssimo:
"E vi outra Besta que subia da terra, e que tinha dois chifres semelhantes aos do Cordeiro, e que falava como o Dragão".
Apocalipse, 13 v 11.
Alguns séculos antes do acontecido, o profeta João antecipou a tragédia.
Gente fina, com aparência de "santo", não conseguiria disfarçar a voz do Dragão.
Joana D'Arc foi queimada por este tribunal implacável.
Está muito claro, para ser desdenhado.
Em Apocalipse, 13, v 15, as duas Bestas, unidas, decretam a morte dos que não rezam pela sua cartilha:
"(...) que fossem mortos todos aqueles que não adorassem a imagem da Besta".
Em nossos tempos, é impossível esconder a história.
Qualquer criança encontra Inquisição nas enciclopédias escolares...e na Internet...
Bastará acessarmos o vocábulo Inquisição.
A tela do computador ficará repleta de "irreligião".
O mundo globalizado escancarou este período negro da nossa história.
Ou aceitavam sem discutir o que eles decretavam ou a fogueira se acendia.
Eles não davam alternativas.
Era se ajoelhar...ou morrer!
Hoje, mais do que nunca, eu acho uma perda de tempo a simples tentativa de dourar a pílula.
Eu tenho diversas Bíblias, traduções modernas e antigas.
Possúo a Bíblia, em 17 volumes, que o Papa Pio XII mandou publicar, no Ano Santo de 1950.
Em quase todas as páginas, foram registrados comentários alusivos ao texto.
Não encontrei a menor referência da Inquisição como cumprimento das profecias apocalípticas.
É como se aquele tribunal não tivesse existido.
Invariavelmente, os comentários de pé de página ignoram o assunto, por completo. .
Como aquelas crianças surpreendidas em flagrante, os teólogos escondem as mãos atrás das costas.
Vocês perguntarão:
Mas, afinal, por que tanto empenho em esconder a verdade?
Hoje, todas as religiões são bem comportadas.
Se houve genocídio, o delito já prescreveu.
Não é tão simples assim, meus amigos...
No fundo...no fundo, o temor dos teólogos é válido.
Lembrem-se que, em Cesaréia de Filipe, Jesus disse que "as portas do inferno não prevaleceriam sobre a sua Igreja".
Os catedráticos não desejam que os crimes da Inquisição demonstrem o prevalecimento do inferno.
Afinal, na religião do amor pregada por Jesus não existe lugar para opressão e violência.
Toda violência é incompatível com o Sermão da Montanha.
Toda violência é incompatível com a religião do Cristo.
Antes de encerrarmos este trabalho, porém, uma dúvida precisa ser esclarecida:
Afinal, as "portas do Inferno não prevaleceriam" sobre qual religião?
No meu entendimento, o próprio Jesus já respondeu esta pergunta.
No diálogo com a mulher samaritana, o Mestre foi claro. "Senhor", disse aquela mulher, "vejo que sois profeta: nossos pais adoraram neste monte. Vós dizeis que Jerusalém é o lugar de adoração.
E Jesus lhe disse:
Já é chegada a hora em que nem neste monte nem no templo de Jerusalém adorareis ao Pai(...).
Deus é espírito, e em espírito deve ser adorado"
.
João, 4 vv 19 a 24.
Não existe um lugar confinando os escolhidos de Deus.
Eles se espalham por todas as religiões da Terra.
O importante não é mais o que eles seguem: o essencial é o que eles são.
Desde os tempos de Jesus, as enormes organizações revestidas de granito e mármore deixaram de ser o essencial.
Esta religião que mora nos corações é a única que não pode sofrer o "prevalecimento do Inferno".
"Deus é espírito, e em espírito deve ser adorado".
Louvado seja Deus.


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