A morte foi a última mentira

Data: sábado, 25 de setembro de 2004

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Nestes dias de terrorismo, violência e mortes, uma coisa nivela os habitantes do planeta: o medo. Todos estão no mesmo barco, inquietos e inseguros. Quando caminhamos por uma estrada, ficamos preocupados com o que iremos encontrar, na próxima curva do caminho. Essencialmente, todos sentem medo da morte. Estranhas doenças estão surgindo, para aumentar a sensação de insegurança. O resultado é uma atmosfera de pânico. Falta-nos a confiança depositada em Deus pelo salmista: "Ainda que eu ande pelo vale das sombras da morte, não temerei mal nenhum, porque Tu estás comigo". Salmo 23 v 4. Será que estas palavras não nos atingem? Será que duvidamos da sua eficácia, em nossos dias? São perguntas que precisamos fazer, quando nosso cristianismo está sendo provado. Se crêssemos na imortalidade, qualquer dúvida seria incoerência. Nem guerras, Nem doenças, Nem o fim do mundo... ...poderiam abalar a nossa confiança.

Certa vez, Francisco de Assis capinava o seu jardim. Alguém que passava lhe perguntou: - Que farias se soubésses que o mundo terminaria hoje? - Continuaria capinando meu jardim, respondeu Francisco.

As Escrituras Sagradas nos fornecem certezas da nossa destinação eterna. Resta sabermos se nós acreditamos nestas promessas. "Ainda que eu andasse pelas sombras e vales da morte, não temeria mal algum". Só estas palavras valem por um passaporte com "visto" pleno. Não há o que temer. O outro lado da vida é mero prolongamento. A luz continuará... A consciência não terá fim... A "luz verdadeira" continuará guiando nossos passos. Para o cristão, a vida deveria ser uma aventura, uma conquista, uma certeza. Não tem importância a duração da jornada. O que vale mesmo é a qualidade da vida. Não "quanto" vivemos, mas "como" vivemos... Castro Alves, o grande poeta dos escravos, desencarnou aos vinte e quatro anos... Keats morreu aos vinte e seis... Jesus de Nazaré foi crucificado aos trinta e três... Desencarnar, cedo ou tarde, não é importante... O importante é marcar a trajetória da vida com ideais, ou até mesmo com sonhos... Toda a reencarnação é muito valiosa. Ninguém poderá desperdiçá-la. O importante é voltar ao seio do Senhor, com algum troféu...com alguma conquista.

Debruçado sobre o alpendre, o menino chorava. Um homem apareceu dentre as árvores, e descansou o feixe de lenhas, que trazia às costas. - Por que choras, filho? - perguntou. - É que não encontrei Ana, - respondeu a criança, soluçante. No outro dia foi Paulo. Agora é Ana que desaparece. Por que isto, papai? O lenhador enxugou-lhe as lágrimas, e, sorridente, lhe disse: - Vou te contar um segredo, filho. Nós moramos neste ermo, porque sofremos uma doença que assusta as outras pessoas. Se procurássemos as cidades, seríamos escorraçados. Felizmente, santo homem está nos tratando e curando. Alcançada a cura, cada um de nós vai sendo reintegrado ao seu verdadeiro lar. Primeiro foi Paulo...depois Ana. Logo...logo...chegará a nossa vez! - Coitado do Paulo e da Ana! - exclamou o menino, sem compreender . Não podem mais armar arapucas no mato, nem pescar lambaris no ribeirão das pedras. - Alegre-se por eles, filho! - disse o lenhador. O lugar para onde eles foram é infinitamente melhor do que este . Muito breve também nós retornaremos ao nosso verdadeiro lar. O menino sorriu, consolado, e o pai, tirando o chapéu, agradeceu a bondade divina.

Eis aí, meus amigos, uma pequena estória que fornece uma visão da nossa própria vida. Estamos aqui de passagem. O universo é o nosso mundo. Deus é o nosso Grande Pai! Nisto deve residir a nossa esperança: o lugar para onde vamos é sempre melhor do que aquele em que vivemos. O espírito, em evolução, progride sempre. Cada passo é uma conquista. Na carne ou fora dela, o ser humano cresce um pouco, todos os dias. Por isso nosso amanhã será melhor que hoje. Não há retrocesso. Aqui, ou acolá, sua casa vai se tornando cada vez melhor. O pastor Peter Marshall nos conta que assistiu a morte de um jovem, atropelado no asfalto de uma rodovia. Naquele instante, "ele olhou para cima... e sorriu" - diz o pastor. "E as suas palavras demonstravam absoluta serenidade: o caminho não é difícil... é suave" - exclamara o rapaz. Indiferente ao sangue que escorria dos seus ferimentos... Indiferente à dor que sentia, o acidentado sorriu. Certamente, ele já vivenciara, em rápidos lances, a beleza do mundo espiritual. Falava da morte, sem temor nem pânico. Encontrava-se num estado de torpor, completamente tranqüilo. - O caminho não é difícil... É suave, repetia ele Desencarnou, serenamente, alguns minutos depois. Penetrando o portal do além, todos os seres humanos se tornam autênticos. Aqui ninguém dramatiza. Com toda a certeza, aquele rapaz já enxergava, no vértice da outra vida, algo mais sublime e super gratificante. Lembremo-nos, meus amigos, que já passamos por outra experiência muito parecida com esta. Já vivemos alguns meses, no ventre de nossas mães. Por uma questão de temor do futuro, o nosso desejo seria permanecer naquele estágio de vida... O medo inconsciente do uma nova experiência desperta o choro... ...Todos os bebês nascem chorando. Afinal, pensam os bebês: por que sairmos desta confortável escuridão? Já temos os nossos olhos... ...nossas bocas... ...nossos ouvidos... ...nossos cérebros... Temos tudo aqui; nada nos falta! Os primeiros temores do reencarnado o forçam a resistir! Eles se encolhem atemorizados. Tem medo de nascer... e sofrer. A natureza faz a sua parte, porém. A criança desliza, e, num segundo, encontra-se fora da prisão. Vê a luz, e pisca os olhos fascinada. Alguma coisa mudou... ...mudou para melhor. Agora ela pode sentir, pode ouvir... ...pode cheirar. Está nos braços da mãe! Recebe a primeira gota da seiva benfazeja: o leite materno! O bebê já sorri, enlevado; a transição lhe foi benéfica. Este novo estágio lhe trouxe lucro. Depois de nascer, ele reconhece: a vida se tornou melhor! Cada degrau é um recomeço: A borboleta colorida bate as asas, abandonando a prisão... Não existe morte: o desencarne é um renascimento. Um dos grandes erros da humanidade é a valorização exagerada da morte física. Jesus foi quase sarcástico, para enfocar este nosso defeito congênito. Usou palavras duras, para destronar este mito. "Deixai aos mortos, o cuidado de enterrar seus mortos..." Lucas, 9 v 60. Alguns racionalistas se horrorizam, considerando falta de caridade, estas palavras de Jesus. Não concordo com eles. Jesus queria apenas alertar-nos de que a morte física não deve ser encarada com tamanha dramaticidade. Ninguém tem o direito de colocá-la num pedestal, acima de todos os valores. A sensação de perda é perfeitamente compreensível. A saudade da presença física é uma demonstração de carinho. A prece e a flor singela é um preito de homenagem... Tudo isto é válido, menos a tendência mórbida de inflacionar o preço da morte. O cristão não tem o direito de sucumbir, diante desta valorização exagerada do desencarne.

Perguntou o sábio à mulher: - Por que choras sobre o sepulcro do teu ente querido? - Ora, porque ali se encontra o seu corpo amado! - respondeu a mulher, com um brilho no rosto. O sábio lhe fez outra interrogação: - Costumas guardar os frascos, depois de usar os perfumes até a última gota? - Não, eu não os guardo! - respondeu a mulher. - Pois saibas, rematou o sábio, que o corpo do teu marido já não contém a seiva da vida... o perfume do amor!

Sepulturas humildes e mausoléus gigantescos - nenhum deles serão capazes de aprisionar a essência do ser humano. Tendo por alicerce somente a vaidade, estas construções não conseguem disfarçar a ilusão de uma grande mentira. Os faraós do Egito ergueram as pirâmides, como sepulcros de luxo, como se o luxo pudesse conceder a imortalidade aos seus corpos. Descendentes e amigos levavam alimentos e bebidas a estes jazigos milionários. Para eles, a imortalidade estava no corpo. Justamente nesta idéia reside o erro fundamental. Idolatrando o corpo de carne, a cultura religiosa termina inflacionando a figura da morte. Todos têm saudade do principe varonil que desencarnou. Devotos desejam de volta o pastor carismático. Por isso, entronizaram a ressurreição da carne como dogma... ...E o espírito foi deixado de lado, em plano secundário. Esqueceram-no, como se não existisse, ou fosse apenas um complemento. Há teólogos mais ousados que vão além: Dizem que os corpos ficam dormindo, no sepulcro, esperando o Juízo Final... Que somente depois de julgados, levantam e voltam a viver. Que que é isto, minha gente? Em parte eu até posso crer neste sono... O corpo cansado repousa no túmulo, até o breve ataque dos vermes que o desintegram... ...e ele é transformado, como energia, para edificação de outros corpos. A morte só existe para nossa personalidade física, e esta parcela material desaparece no pó. Lembremos o que diz a Bíblia: "O pó volte à terra". Eclesiastes, 12 v 7. O corpo não partilha da imortalidade. No Juízo Final quem vai "ser suscitado" outra vez é o espírito, que nunca morre. É ele quem vai "aparecer" diante do Cristo-Juiz. Respondendo aos saduceus, Jesus alude ao dito de Moisés de que "Deus é o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó"... ...E remata dizendo: "Deus não é Deus de mortos, mas de vivos". Lucas, 20 vv 37 e 38. É o Mestre mostrando que atrás da cortina da eternidade, os grandes artistas não saíram de cena. Fica claro que Abraão, Isaac e Jacó estavam vivos, e conscientes em algum lugar. Por favor, meus amigos, sejamos razoáveis. Acreditar que existem corpos esperando pela ressurreição há milhões de anos seria negar até a própria sabedoria divina. O corpo é o escafandro. O corpo é semelhante à roupa que vestimos temporariamente. O espírito é a verdadeira luz... a verdadeira realidade. Esta essência continuará sua trajetória, no rumo do Cristo. Na direta proporção do merecimento, o espírito gozará do aconchego e da proximidade do próprio Deus. Todos nós nascemos para este aprendizado. Numa poesia chamada "Abaixo a Morte", James Weldon Johnson, nos fala do desencarne. Vale a pena conhecê-la: : "Não chore, não chore, ela não está morta... Está descansando no seio de Jesus. Marido de coração despedaçado não chore mais; Filho, cheio de dor - não chore mais; Ela voltou para casa somente na manhã de ante-ontém... Deus estava olhando para baixo, Olhando todos os seus filhos... O olhar de Deus caiu, então, sobre irmã Carolina, Se contorcendo de dor... na cama. E o grande coração de Deus se encheu de piedade, Uma piedade eterna. E Deus, sentado em seu trono, Ordenou ao Anjo alto à sua direita: Chame a morte! E aquele Anjo alto gritou, em uma voz Que parecia o troar de um trovão: Chame a morte! Chame a morte! E o eco foi ressoando, nas vielas do céu, Até chegar lá atrás, num lugar sombrio, Onde a morte estava, com seus pálidos cavalos brancos... E a morte ouviu o chamado, Pulou em seu cavalo mais ligeiro, Pálido como um papel ao luar. Subindo a rua de ouro, a morte cavalgou, E as patas dos cavalos tiravam fogo do chão, Mas não faziam barulho. Para cima, sempre para cima, a morte cavalgou... ...até chegar ao grande trono branco. E Deus lhe disse: - Desça, Morte, desça. Vá a Savannah, Geórgia, Lá em Yamacraw, e procure a irmã Carolina... Ela suportou o fardo e o calor do dia...e se encontra exausta. Trabalhou longamente em minha vinha, Ela está cansada... Ela está muito cansada! Desça, Morte, e a carregue em seus braços. A Morte não disse uma única palavra, Soltou as rédeas do seu pálido cavalo branco, ...e comprimiu as esporas. E para fora, e para baixo cavalgou, Atravessando as portas peroladas do céu, Além dos sóis, das luas e das estrelas... Para muito longe cavalgou a Morte, Deixando para trás um relâmpago; Para baixo veio, bem reto, no caminho da terra... Enquanto todos vigiavam, ao redor da cama, Irmã Carolina virou os olhos, e percebeu o vazio... O que ela viu, ninguém conseguiria ver! Enxergou a velha Morte, como estrela cadente. A Morte não assustava mais irmã Carolina. E ela murmurou para todos: Estou retornando para casa. Sorriu, e fechou, suavemente, os olhos... E a morte a tomou como criança... E ela se deitou em seus braços gelados. E a Morte cavalgou, novamente, Para cima, para muito além da estrela da tarde... Quando a luz da glória brilhou, A Morte viu Deus, sentado no grande trono branco, E ali, ela depositou Irmã Carolina. E Jesus, com suas próprias mãos, Enxugou suas lágrimas...e lhe desfez as rugas da face. E os anjos cantaram uma pequena canção, E Jesus a balançou em seus braços... E todos cantavam: Descanse, descanse... Você não morreu... Simplesmente retornou ao seio de Jesus". Louvado seja Deus!


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